Na última década, a Espanha consolidou-se como um dos epicentros mundiais da fiscalização sobre celebridades e personalidades públicas. O país, conhecido por sua paixão pelo futebol e pela música, também tem protagonizado uma ofensiva tributária que já alcançou alguns dos maiores ícones do entretenimento e do esporte — entre eles, Carlo Ancelotti, Cristiano Ronaldo, Lionel Messi e Shakira.

Apesar de diferentes em suas trajetórias profissionais, todos foram alvos de acusações formais de fraude fiscal ligadas a uma figura comum: a exploração de direitos de imagem por meio de estruturas empresariais internacionais, muitas vezes sediadas fora da Espanha.

Neste artigo, falar-se-á a respeito do cerco fiscal das celebridades que residem na Espanha, cujas ações voltadas às suas respectivas imagens acabam virando uma dívida.

Direitos de imagem e tributação: o padrão que se repete

Em todos os casos, o foco da acusação não recaiu sobre os salários convencionais recebidos por clubes ou gravadoras, mas sobre a omissão de receitas provenientes da imagem pessoal. Essas receitas foram, em regra, canalizadas por empresas intermediárias, algumas sediadas em jurisdições tidas como paraísos fiscais, outras localizadas em países europeus com tributação diferenciada.

Caso Carlo Ancelotti

O atual técnico da Seleção Brasileira foi acusado de omitir cerca de 1 milhão de euros em rendimentos de imagem referentes aos anos de 2014 e 2015, quando comandava o Real Madrid. A Promotoria espanhola pediu 4 anos e 9 meses de prisão, alegando que ele teria utilizado empresas para ocultar ganhos vinculados a sua imagem pessoal. Embora o caso ainda esteja em trâmite, a repercussão foi menor, talvez devido ao perfil discreto e à reputação sólida de Ancelotti como gestor respeitado no futebol mundial.

Caso Carlo Ancelotti

Caso Cristiano Ronaldo

Em 2019, o craque português aceitou um acordo judicial que envolveu o pagamento de 18,8 milhões de euros em multas e impostos atrasados, além de uma pena simbólica de 2 anos de prisão, suspensa mediante pagamento. A acusação envolvia receitas milionárias obtidas por meio de empresas na Irlanda e Ilhas Virgens Britânicas, que teriam sido usadas para evitar a tributação plena na Espanha.

Caso Cristiano Ronaldo

Caso Lionel Messi

Messi foi condenado a 21 meses de prisão em 2016, convertidos em multa, por fraude fiscal de aproximadamente 4,1 milhões de euros. A estrutura utilizada envolvia empresas em Belize e Uruguai, e o caso gerou forte repercussão por ter sido o primeiro envolvendo uma megaestrela do futebol. A defesa de Messi sustentou que ele não compreendia os detalhes fiscais, delegando tudo ao pai e aos assessores.

Caso Lionel Messi

Caso Shakira

A cantora colombiana enfrentou o caso mais emblemático fora do futebol. Acusada de declarar residência nas Bahamas, enquanto supostamente vivia mais de 183 dias por ano na Espanha entre 2012 e 2014, Shakira foi cobrada em €14,5 milhões. Em 2023, firmou acordo com a Promotoria, reconhecendo parte da acusação e pagando €7,3 milhões para evitar o julgamento. A alegação central do fisco era a simulação de residência para fins de elisão tributária.

Caso Shakira

Elisão ou evasão fiscal: onde está a linha tênue?

A discussão nesses casos gira em torno de uma questão delicada no mundo tributário: onde termina o planejamento fiscal legítimo e começa a fraude?

É importante diferenciar:

O que é Elisão fiscal?

Elisão é o planejamento tributário lícito, em que o contribuinte organiza suas operações de forma a pagar menos impostos dentro da legalidade, aproveitando brechas, incentivos ou tratados internacionais.

O que é Evasão fiscal?

Evasão é a prática ilícita de ocultar ou falsear informações para reduzir ou evitar a tributação, geralmente por meio de simulação, uso de empresas de fachada ou omissão de rendimentos.

Utilizar empresas no exterior para gestão de imagem ou royalties não é, por si só, ilegal. O que o Fisco espanhol questiona é a substância econômica dessas estruturas:

  • Elas possuíam sede real? 
  • Tinham funcionários, diretoria, contas bancárias ativas?
  • Operavam com autonomia, ou eram apenas empresas de fachada?

A ausência de substância e o vínculo direto com o beneficiário residente na Espanha são os elementos que fundamentam a acusação de fraude fiscal ou simulação negocial.

Residência fiscal e jurisdição: o peso da escolha

A agressividade fiscal da Espanha contrasta com a abordagem mais branda adotada por outras jurisdições europeias. Países como Reino Unido, Irlanda, Suíça e até França adotam critérios mais objetivos sobre residência e planejamento fiscal internacional. A Espanha, por sua vez, tem ampliado o conceito de domicílio fiscal, considerando, inclusive, presença afetiva e vínculos familiares como indicativos de residência, o que foi crucial no caso de Shakira, por exemplo.

Ao mesmo tempo, a Receita espanhola usa esses casos para dar exemplo público e reforçar seu discurso de que “nenhuma estrela está acima da lei”. A imprensa cobre com voracidade cada nova acusação, e o dano reputacional, mesmo que temporário, é profundo.

Lições corporativas e jurídicas para planejamento internacional

Para profissionais da área de planejamento patrimonial e estruturação internacional, como é o caso da TelliCoJus, esses episódios oferecem lições valiosas:

Substância importa: Toda estrutura offshore deve ter função operacional legítima, documentação completa e registros compatíveis com o volume de operações.

Residência fiscal deve ser clara e bem documentada: Especialmente para pessoas com múltiplas residências ou rotinas internacionais, é crucial comprovar onde vivem, trabalham, votam, estudam os filhos, pagam contas, e passam seus dias.

Direitos de imagem exigem estruturação cuidadosa: Empresas que administram ativos intangíveis precisam de cuidado extra, tanto na redação contratual quanto na alocação geográfica e tributária.

Existem países mais rígidos: A Espanha, por exemplo, apresenta grande rigidez nessa fiscalização. Ela não aceita a utilização de empresas offshore em certas situações e restringe muito em outros cenários. Entretanto, existem Fiscos que são menos vorazes nesse aspecto. 

Quando a imagem vira dívida e como se proteger com estratégia internacional

Quando a imagem vira dívida e como se proteger com estratégia internacional

Celebridades são o novo alvo, mas qualquer contribuinte global pode ser o próximo. Os casos de Ancelotti, Messi, Ronaldo e Shakira não são exceções ocasionais. Eles revelam uma tendência global: a intensificação do controle sobre rendas transnacionais, especialmente aquelas de natureza intangível, como marca pessoal, imagem, royalties e ativos digitais.

Mais do que nunca, é indispensável aliar estratégia fiscal e transparência jurídica, com o suporte de especialistas que compreendam a linguagem dos fiscos internacionais e que saibam onde termina a inteligência tributária e começa o risco penal. 

Na era da informação cruzada (CRS, FATCA, tratados multilaterais), estruturar com substância, coerência e propósito legítimo deixou de ser diferencial: é pré-requisito para dormir tranquilo.

Mais do que nunca, é indispensável unir estratégia fiscal e segurança jurídica, com o suporte de especialistas em direito internacional e tributação global. Na TelliCoJus, ajudamos empresários, investidores e famílias a estruturarem seus negócios e patrimônios de forma inteligente, transparente e blindada contra riscos fiscais internacionais. Se você deseja expandir com segurança e dormir tranquilo em um mundo cada vez mais fiscalizado, fale com nossos especialistas.